2. Organização da Academia

 

 

Se entrássemos nos aposentos de Platão na Academia, provavelmente encontraríamos um quarto simples, que servia de aposento de dormir, de sala de leitura e de sala de trabalho. Este quarto estaria ornamentado com dois quadros representando Sócrates  no seu auge e no final da sua vida (C. Planeaux, 1998).

Um deles seria uma cena do diálogo de Protágoras de Platão: Sócrates está levantado em posição de se ir embora mas Cálias, segurando-lhe na mão, exigia que o filósofo continuasse a discussão com Protágoras. Retratados nesta cena estariam  também Hípias, Pródico, Eriximaco, Fedro, Andron, Pausanias, Agaton, Adeimantos, Crítias, Hipócrates e Alcibíades.

Na parede oposta, estaria representada uma cena do diálogo Fedro em que Sócrates se encontra rodeado pelos seus amigos no dia da sua morte.

 


Neste quarto, encontraríamos também a cadeira de professor (thronos), pequenos bancos para alguns alunos (bathra), um quadro branco (leukoma), um globo celeste, um modelo mecânico do percurso dos planetas do céu, um globo terrestre e ainda uma colecção de mapas.



Deveria também existir uma biblioteca, embora na altura possuir uma biblioteca fosse muito raro. A biblioteca de Platão incluía seguramente uma colecção de livros entre os quais figurava os escritos dos pitagóricos, as peças de Sófocles e Aristófanes e algumas obras de Tucidíades.

Poderíamos ainda ver um relógio despertador feito pelo próprio Platão, que era um madrugador (C. Planeaux, 1998) e que considerava que deveríamos restringir o nosso sono o mais possível.

Além disso, na Academia existiam diversas salas de aula e quartos para os discípulos.

***
A Academia estava organizada como uma comunidade constituída pelos membros mais avançados e pelos jovens estudantes. Não se tratava de modo algum de um grupo em que um era o sábio e os outros se encontravam à procura das doutrinas ou dos serviços do mestre mas de uma comunidade de estudiosos com diferentes graus de desenvolvimento. Embora Platão fosse o fundador da escola (scholarchos), parece ter desenvolvido em relação aos membros mais avançados da sua escola uma relação do tipo "primeiro entre iguais", sem nenhum lugar de destaque.

A metáfora usada no Index Academicus acerca do papel de Platão é reveladora: "agir como um arquitecto e resolver problemas", enquanto os outros membros da escola o seguiam.

"O papel de Platão parece ter sido não o de um "mestre" ou até de um director do seminário, distribuindo temas para pesquisa ou prémios de ensaios, mas o de um pensador individual cujo discernimento e capacidade na formulação de um problema lhe permite oferecer um concelho geral ou uma crítica metódica a outros pensadores individuais que respeitem a sua sabedoria e que possam ser dominados pela sua personalidade, mas que se considerem igualmente competentes a lidar com os detalhes dos diversos assuntos".

(Patrick,1972)

Diz-se por vezes que o contacto de Platão com a irmandade Pitagórica da Itália Meridional, imediatamente antes da fundação da Academia, lhe teria sugerido as linhas gerais de organização da sua escola. Pode haver alguma verdade nisto mas não há nenhuma evidência que o garanta. O que se sabe é que a Academia tinha uma sólida estrutura institucional. Era uma comunidade cujos membros se achavam estreitamente unidos pela amizade, por um forte vínculo afectivo, senão passional, entre mestres e alunos.

No que diz respeito a aspectos económicos, parece que  Platão não cobrava honorários. No entanto, apenas aqueles que tinham possibilidades materiais para se sustentarem por um número considerável de anos podiam ser membros da escola de Platão. 

Acerca da regulamentação para os alunos da academia, não existem muitas certezas. Talvez houvesse horas de reunião, horas de discussão e horas de silêncio, a par com normas de convívio, de trabalho e de civilidade. Não havia exames mas pensa-se que havia provas de maturidade. Platão parece ter sido o primeiro a utilizá-las na indagação das qualidades de estudo e de reflexão dos seus discípulos e ouvintes.


A escola de Platão foi a primeira a reunir  todas as características de uma verdadeira escola:

  • ao contrário das palestras dos gramatistés onde se ensinava a ler e a escrever, na Academia veiculavam-se novos saberes, 

  • ao contrário dos sofistas que se dedicavam, cada um, ao ensino dos temas da sua preferência ou especialidade, na academia era ensinado um corpo organizado de conhecimentos

  • ao contrário dos sofistas e de Sócrates, a academia constituía um espaço próprio para o ensino dentro da cidade 

  • ao contrário da escola de Isócrates, a academia possuía um regulamento interno que previa a sua continuidade para além da morte do seu fundador.

 

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Olga Pombo opombo@fc.ul.pt