A relação 9/10

 

        É sabido que os Gregos usavam um cânone secreto de proporções herdado dos egípcios que, por seu turno, o haviam guardado desde a mais alta antiguidade. No início do século XX, o americano Jay Hambidge, quando se dedicou ao estudo dos modelos geométricos e de proporção utilizados nas obras gregas de pintura, escultura, cerâmica e arquitetura, redescobriu esse antigo cânone.

        Almada, que  tinha um conhecimento profundo dos sistemas matemáticos gregos, da sua origem e da sua transmissão ao longo dos tempos, teve acesso ao resultado desse estudo, entretanto publicado, e empreendeu uma longa caminhada de redescoberta ao longo da qual compreendeu de que forma o conhecimento grego estava enraizado em todas as obras que posteriormente surgiraram, desde a Antiguidade Clássica ao Modernismo.

        Almada tinha consciência da importância de dominar o cânone, e isso levou-o não só ao estudo como à aplicação, em grande parte da sua obra, da sua «chave» - a relação 9/10.

 

"Cânone e relação nove/dez são uma e a mesma coisa. A relação nove/dez é uma constante do cânone. Através da história do número, e é de número que se trata, tem havido várias expressões, várias palavras que significam o cânone. Por exemplo, a começar pela primeira: número, década, theleon (na citação de Vitrúvio quando diz: «o número perfeito a que os gregos chamam theleon); e parece que foi Pitágoras quem primeiro usou os termos «número perfeito».

Mas para que entendamos bem como a Humanidade estabeleceu continuidade neste conhecimento citaremos esta frase célebre de Clemente de Alexandria: «Arquitas de Tarento deu a Platão o livro de Filolau». Esta frase de Clemente de Alexandria estabelece bem a continuidade do conhecimento imutável - porque imutável em conhecimento só pode ser o cânone. O cânone permanece, isto é, continua.

Outras expressôes mais recentes também são significados da constante relação nove/dez. Por exemplo: «número de ouro», que se pode considerar uma expressão do Renascimento. Simplesmente, há aqui uma coisa que não podemos imediatamente comunicar e que é: a separação do número em duas grandes divisões - número em cálculo e número sem cálculo. Evidentemente, o cânone é sem cálculo; as interpretações do cânone são invariavelmente cálculo ou não cálculo. Mas «número de ouro», é cálculo a cavalgar o cânone mesmo (...) Ora o número perfeito desconhece o «número de ouro» e a inversa é impossível. São dois sistemas do mesmo número, paralelos entre si, e por sua vez paralelos ao número imanente. A este e a todos os sistemas rege-os «a unidade, isto é, o ponto não espacial» (Aristóteles)"

 

(Almada Negreiros, cit in Lima de Freitas, 1990, p.68)

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