Descartes e a Matemática
Descartes é um dos grandes matemáticos de todos os tempos. Ele foi um dos fundadores da
geometria analítica: a geometria passou a beneficiar da linguagem da análise, mais
fácil de manejar e, por outro lado, a análise ganhou com o suporte intuitivo fornecido
pela geometria. Foi no
decorrer do ano de 1637 que Descartes concluiu o Discurso do Método acompanhado de
três anexos, o último dos quais A Geometria. Escrita com a intenção de
ilustrar matematicamente as considerações filosóficas gerais do Discurso do Método
relativamente ao método científico, A Geometria é a única obra matemática
publicada pelo filósofo e matemático, ocupando uma centena de páginas. Página de La Geometrie
De entre os vários domínios matemáticos em que Descartes
trabalhou, salientamos os seguintes:
Foi
Descartes quem, imaginando o sistema de coordenadas de um ponto, construiu as bases
da Geometria Analítica. Para dar a sua justa relevância e homenagear
esse facto, denominam-se ainda hoje de cartesianos os referenciais em que se
representam graficamente as funções.
Recordemos brevemente como se constroem esses gráficos:
Correspondência
entre o plano e IR²
·
Traçamos duas rectas orientadas
perpendiculares que se intersectam num ponto 0, origem dos eixos. ·
Escolhemos uma unidade e representamos os
números inteiros nas duas rectas. ·
No eixo horizontal, os números positivos
são representados à direita do ponto 0. ·
No eixo vertical os números positivos são
representados acima do ponto 0. ·
Ao eixo horizontal chamamos eixo das
abcissas ou eixo dos xx. ·
Ao eixo vertical chamamos eixo das
ordenadas ou eixo dos yy.
Designamos este conjunto de eixos por referencial
cartesiano.
Para
determinar o ponto correspondente a um par ordenado, devemos ter em conta que: 1.
O 1º elemento é a abcissa do ponto - 1ª
coordenada. 2.
O 2º elemento é a ordenada do ponto - 2ª
coordenada. 3.
Os dois elementos constituem as coordenadas do
ponto.
A um par
ordenado de números reais (o primeiro no eixo dos xx e o segundo no dos yy) corresponde
um ponto do plano que se situa na intersecção da recta paralela ao eixo dos yy que passa
no ponto do eixo dos xx de abcissa a, com a recta paralela ao eixo dos xx que passa no
ponto do eixo dos yy de ordenada b.
Assim, se P for o conjunto dos pontos do plano e IR² o conjunto de todos os pares
ordenados de números reais, podemos estabelecer uma correspondência biunívoca entre P e
IR²: a cada ponto corresponde um par e reciprocamente.
O plano fica dividido em quatro partes - os quadrantes.
Correspondência entre o espaço e IR³
Consideram-se três eixos, perpendiculares dois a dois, com a mesma origem em O: o
eixo dos xx ou das abcissas, o eixo dos yy ou das ordenadas e o eixo dos zz ou das cotas.
A um terno de números reais (em que o primeiro é a abcissa, o segundo a ordenada e o terceiro a cota) corresponde um ponto do espaço, obtido
através de paralelas aos eixos.
Os eixos, dois a dois, definem, assim, planos - chamados planos coordenados, ou
seja, xOy, yOz e xOz.
Deste modo, se E for o conjunto de todos os pontos do plano e IR³ o conjunto de
todos os ternos ordenados de números reais, podemos estabelecer uma correspondência
biunívoca entre E e IR³: a cada ponto do espaço corresponde um terno de números reais
e reciprocamente.
O espaço fica dividido em oito porções - os octantes. Todas as leis da
geometria euclidiana permanecem verdadeiras nesta nova geometria. Por exemplo, na
geometria euclideana uma recta é descrita por dois pontos e, na geometria cartesiana, uma
vez que um ponto é descrito por um par de números, então uma recta pode ser descrita
por dois pares. Um exemplo do trabalho de Descartes utilizando o conceito de coordenadas é o da demonstração de que as diagonais de um rectângulo têm comprimentos iguais.
1.
Consideremos uma curva como
mostra a figura: e seja P um ponto da curva. Podemos,
assim, estudar a curva se analisarmos a posição do ponto P que se desloca para cima ou
para baixo quando a linha vertical se move para a direita ou esquerda. A posição é,
pois, a distância x a um ponto fixo O. A linha vertical PQ dá-nos a distância, y, a que
o ponto P se encontra acima da linha OQ. Deste modo, para cada posição de P teremos um
valor de x e de y. O que caracteriza cada curva é, pois, a relação entre x e y.
2. Consideremos uma linha recta que passe pelo ponto O e que
faça um ângulo de 45º com a linha horizontal, como mostra a figura:
Se deslocarmos a linha PQ, haverá uma posição P tal que a distância y será
igual a x. OQP forma, assim, um triângulo isósceles, ou seja, OQ é igual a OP. Temos
que y=x caracteriza qualquer ponto da linha recta, isto é, para um ponto fazer parte da
linha recta ele terá de satisfazer a equação y=x. Ao ponto R, por exemplo, corresponde
um valor y diferente do de x, ou seja, R não pertence à linha recta.
Se considerarmos, como já vimos, um sistema de eixos perpendiculares com
intersecção O, temos que qualquer ponto de uma curva fica definido pelo valor de x
(abcissa de P) e pelo valor de y (ordenada de P).
3. Vejamos ainda como a equação da circunferência que
conhecemos, surgiu naturalmente para Descartes.
Consideremos a seguinte figura:
onde o raio da circunferência é 5. O
Teorema de Pitágoras diz-nos, pois, que x²+y²=25, pois x e y são os catetos de um
triângulo rectângulo de hipotenusa 5.
Assim, cada ponto P da circunferência de coordenadas (x,y) satisfaz esta
equação. Qualquer ponto que não pertença à circunferência, não satisfaz aquela
equação.
A Geometria de Descartes também permite representar uma curva quando nos é dada
uma equação. 4. Consideremos agora a equação y=x² Por outro lado, quando PQ se move para
a esquerda de O, o valor da abcissa de P é negativo. Porém, o valor de y é x² onde se verifica haver uma simetria em relação ao eixo dos yy.
Esta associação entre equação e
curvas, possibilitou várias aplicações em diversos campos, em especial do domínio
científico. As curvas foram, mais tarde, utilizadas em telescópios, microscópios,
máquinas de raio-X,... Tal como no plano, Descartes também verificou ser possível relacionar equações algébricas e figuras geométricas no espaço. Vejamos alguns exemplos.
A esfera é um conjunto de pontos no espaço que estão situados à mesma distância de um ponto - o centro da esfera. Consideremos o seguinte exemplo como
mostra a figura, cujos pontos distam 5 unidades do centro da esfera. Seja ainda o centro
da esfera coincidente com a origem do referencial a três dimensões. Um ponto P na esfera
tem coordenadas (x,y,z). Verifica-se que x e y são os catetos de um triângulo
rectângulo com hipotenusa OR. Pelo teorema de Pitágoras, tem-se: Notemos as semelhanças desta equação
com a da circunferência.
Tal como para a esfera, chegamos à
seguinte equação do parabolóide x²+y²=z Existe, assim, uma ligação entre as equações das figuras no plano e no espaço.
Estavam, pois, abertos os caminhos para
se explorar uma geometria no espaço. O mundo físico podia ser visto a quatro dimensões.
Qualquer acontecimento tem lugar num certo espaço e tempo. A posição no espaço poderia
ser dada por um terno de números x, y e z, e o tempo seria a quarta coordenada t.
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