"Fósseis vivos" são organismos (ou melhor,
táxones de categoria espécie e género) actuais pertencentes a grupos
biológicos (de categoria superior: ordem, classe) que, no passado geológico
da Terra, foram muito mais abundantes e diversificados que na actualidade.
Frequentemente, a expressão "fóssil vivo" é também
utilizada
informalmente para qualificar organismos de grupos biológicos actuais
que são morfologicamente muito similares a organismos dos quais há
conhecimento apenas do registo fóssil.
Um pouco de história da
Paleontologia
Foi Charles Darwin que deu origem a esta expressão. A menção a fósseis
vivos é feita na sua obra fundamental "A
Origem das Espécies", publicada em 1859, no âmbito da discussão
em torno do tema "Circunstâncias
favoráveis à Selecção Natural". A este propósito Darwin,
comentando a ocorrência em determinados ambientes actuais de grupos
biológicos aparentando possuir uma morfologia mais conservadora do que a de
outros grupos contemporâneos, escreveu: "(...) é em ambientes de água
doce que encontramos sete géneros de peixes ganóides, relíquias de uma ordem
em tempos predominante. E é nesses ambientes que encontramos alguns dos
organismos mais anómalos conhecidos no mundo, tais como o
Ornithorhynchus e o
Lepidosiren, que, tal
como os fósseis, estabelecem, de algum modo, a ligação entre grupos
biológicos agora muito afastados na escala natural. Estas formas anómalas
podem quase ser apelidadas de fósseis vivos, pois resistiram até à
actualidade, devido ao facto de terem habitado áreas confinadas e por,
consequentemente, terem sido sujeitos a uma selecção menos intensa."
(Tradução livre. Negrito nosso.)
Na altura, quando a Teoria da Evolução de Darwin estava
ainda a dar os primeiros passos e o conhecimento do mundo biológico e
paleontológico era muito fragmentário (por comparação com o que actualmente
já é conhecido), a questão da existência de "fósseis vivos", assim como de
"formas de transição", era fundamental para a discussão e a compreensão dos
processos evolutivos. Hoje em dia, estas questões, porque em grande parte
ultrapassadas, e com elas os "fósseis vivos", perderam relevância
científica.
Actualmente, a expressão "fóssil vivo" vulgarizou-se,
mas, até há bem pouco tempo, um outro termo era adoptado entre a comunidade
científica para designar estes grupos biológicos, representantes únicos na
actualidade de grupos biológicos mais abundantes e diversificados no
passado: "formas-relíquia".
Exemplos de "fósseis
vivos"
Um dos exemplos mais conhecidos de "fósseis vivos" são os
celacantos actuais (espécies
Latimeria chalumnae e L. menadoensis), um grupo de peixes.
Celacantos do Devónico. Fósseis e reconstituição
dos organismos.
.
Ilustrações de Smith Woodward em Smith (1957)
Old Fourlegs, The story of the Coelacanth. Readers Union, Longmans,
Green, London, 260 pp.
Até à descoberta nas águas do canal de Moçambique, junto
às ilhas Comores, de um exemplar vivo que foi atribuído à espécie nova
Latimeria chalumnae, em 1939, os celacantos só eram conhecidos do
registo fóssil, sendo os mais recentes datados do Cretácico, com mais de de
65 milhões de anos de idade.
Primeiros exemplares de Latimeria chalumnae
descobertos: 1939 (1) e 1952 (2).
.
Fotos de Smith (1957) Old Fourlegs, The story
of the Coelacanth. Readers Union, Longmans, Green, London, 260 pp.
Outro exemplo bem conhecido é o do
ginkgo (Ginkgo biloba),
uma espécie de árvores.
Outro ainda é o do
Nautilus e do
Allonautilus, dois
géneros de cefalópodes representados na actualidade por cerca de meia-dúzia
de espécies. O grupo a que estes géneros pertencem, os nautilóides
(subclasse Nautiloidea), encontra-se representando na actualidade apenas por
estes dois géneros, mas foi um elemento muito importante dos ecossistemas
marinhos, por exemplo, do Paleozóico inferior, possuindo registo fóssil
abundante e diversificado (com muitos géneros e espécies diferentes).
Há que salientar que, apesar de espécies da actualidade poderem estar,
também, representadas no registo fóssil recente, estes indivíduos actuais,
estes "fósseis vivos", apesar de morfologicamente muito similares aos seus
parentes conhecidos do registo fóssil remoto (do Cretácico, no final do
Mesozóico, por exemplo, no caso dos celacantos), não pertencem, exactamente,
às mesmas espécies. Ou seja, não são a mesma entidade biológica.
Mitologia científica e utilidade do conceito de
"fóssil vivo"
A expressão "fóssil vivo" há muito que, entre o público em geral, caiu no
domínio da "mitologia científica" e é tão popular e utilizada de modo
tão indiscriminado que, muitas vezes, é usada apenas para designar
organismos actuais com aspecto invulgar e que por isso parecem, aos olhos do
leigo, "primitivos" ou, usando outra expressão trivial e desprovida de
qualquer significado científico, "pré-históricos".
De sublinhar, ainda, que apesar de muito popular, este termo é informal,
desprovido de qualquer rigor científico, pois um "fóssil vivo" não tem
qualquer relação directa com
fósseis.
Além disso, o conceito de "fóssil vivo", por não ser
útil, não é usado formalmente em Paleontologia, nem no âmbito dos estudos de
evolução biológica. Por outro lado, sua utilização inadequada,
nomeadamente no contexto dos currícula do Ensino Básico e Secundário,
levanta -- do ponto de vista da abordagem de temas evolutivos -- mais
problemas do que os que pretensamente "resolve".
Em suma, o conceito de "fóssil vivo" em contextos
científicos e educativos deveria, pura e simplesmente, ser abandonado
por não ser minimamente objectivo, nem útil, na abordagem de temas
paleontológicos ou evolutivos.
Fóssil
(substantivo masculino): Todo e qualquer vestígio identificável,
corpóreo ou de actividade orgânica, de organismos do passado, conservado em
contextos geológicos, isto é, nas rochas
(do latim
fossile < fossu, cavado, retirado do chão cavando).
Tipos básicos de fósseis:
somatofósseis e
icnofósseis.
Paleontologia na Internet
Paleontologia no Departamento de
Geologia da FCUL
Museu de História Natural da Universidade de
Lisboa
Paleontologia e História da Terra
Introducción a
la Paleontología
The Trace
Fossil Mystery - Nova Scotia Museum
Trace Fossils
- The Paleontology Portal
Palaeobase. Database of fossils
Discovering
Dinosaurs
Discovering
Dinosaurs
Dino Directory
- NHM London
Carlos Marques da Silva - Lisboa, 18 de Janeiro
de 2008