OS JESUÍTAS EM PORTUGAL
A história dos jesuítas em Portugal está dividida em quatro períodos: o primeiro vai de 1540 a 1759, o segundo de 1829 a 1834, o terceiro de 1848 a 1910, e o quarto e último do exílio à actualidade. PRIMEIRO PERÍODO ( 1540 a 1759 ) A vinda dos jesuítas para Portugal deve-se ao rei D. João III a quem Diogo de Gouveia indicara a existência de um grupo de clérigos capazes de converter a Índia. Então Inácio de Loiola enviou para Portugal o navarro Francisco Xavier e o português Simão Rodrigues.
Simão Rodrigues Pintura a óleo sobre tela
existente na Residência de S. Roberto Belarmino (Casa de Escritores), Lisboa. O primeiro partiu no ano seguinte para a Índia enquanto que o segundo ficou encarregue de criar a Província de Portugal, que foi criada em 1546 tendo sido a primeira província da Ordem. Foi graças a alguns benfeitores, com especial destaque para a família real, que o crescimento da Companhia de Jesus em Portugal se deu de uma maneira extremamente rápida. Em 1542, foi fundado o Colégio de Jesus em Coimbra que tinha como objectivo a formação dos membros mais novos da Ordem.
À
esquerda o antigo Colégio de Jesus ou das "11 mil Virgens", hoje Sé
Nova e edifícios universitários; à direita o famoso Colégio das Artes (que
foi a primeira Faculdade de Filosofia dirigida pela Companhia de Jesus em
Portugal) e o Noviciado. Foi no entanto em Lisboa no ano de 1553 que foi inaugurado o primeiro Colégio no qual os jesuítas deram aulas públicas: O colégio de Santo Antão. Em 1559, foi fundada pelo Cardeal D. Henrique a Universidade de Évora e entregue à Companhia de Jesus.
UNIVERSIDADE DE ÉVORA Fotografia
existente no Arquivo da Cúria Provincial da Prov. Port. da Companhia de Jesus. Com o decorrer do tempo, a acção pedagógica dos jesuítas foi-se espalhando a outras cidades do país como Braga, Bragança, Funchal, Angra, Ponta Delgada, Faro, Portalegre, Santarém, Porto, Elvas, Faial, Setúbal, Portimão, Beja e Gouveia. À medida que iam aumentando o número de casas, ia também aumentando o número de jesuítas: 400 em 1560, 620 em 1603, 662 em 1615, 639 em 1639, 770 em 1709, 861 em 1749 e 789 em 1759. Os jesuítas em Portugal chegaram a dirigir cerca de 30 estabelecimentos de ensino que formavam a única rede escolar orgânica e estável do País. O ensino era gratuito e aberto a todas as classes. Em meados do século XVIII, o número total de alunos rondava os 20000 numa população de 3000000 de habitantes.
Mas, em Portugal, os jesuítas não estavam só ligados à educação. Também davam catecismo e entregavam-se aos ministérios sacerdotais e a obras de caridade. Ocupavam-se dos presos, visitavam hospitais, assistiam os condenados à morte e, indiferentes aos perigos, excediam-se em generosidade por ocasião de epidemias e calamidades. Uma das prioridades da Companhia de Jesus era a actividade missionária. Assim, à medida que os portugueses foram chegando cada vez mais longe, os jesuítas acompanharam a sua expansão. Em 1542, Francisco Xavier desembarcou em Goa com dois companheiros e, depois de percorrer várias regiões da Índia, esteve em Malaca e nas Molucas, chegando ao Japão em 1549. Veio a falecer em 1552 quando estava prestes a entrar na China. Apesar disso, as missões continuaram e os jesuítas chegaram a Macau, ao império do Grão Mogol, à China, a Pegu, a Bengala, à Cochinchina, ao Cambodja, ao Tibete, a Tonquim, ao Sião e ao Laos. Em África, os jesuítas estiveram no Congo, em Angola, na Etiópia e em Moçambique. Mais tarde iniciaram uma missão que passava por Cabo Verde e que os levaria depois à Guiné e à Serra Leoa. A primeira expedição ao Brasil deu-se em 1549 e, a partir daí, verificaram-se numerosas levas de missionários. Toda esta actividade foi bruscamente interrompida por decisão do Marquês de Pombal em 1759 ao decretar a expulsão dos jesuítas de todos os territórios portugueses. As causas desta decisão foram sobretudo de ordem ideológica e política. Para A Companhia de Jesus constituía um obstáculo à implementação do seu projecto político iluminista e centralizador. MARQUÊS DE POMBAL Uma vez que os jesuítas dominavam o sistema de ensino em Portugal e no Ultramar e tinham um património cultural invejável, eles constituíam um motivo mais do que suficiente para se tornarem uma ameaça para a implementação do sistema. Foi então que o Marquês de Pombal iniciou uma campanha anti-jesuítica tendo feito uma série de acusações contra os jesuítas que foram espalhadas por toda a Europa. SEGUNDO PERÍODO ( 1829 a 1834 ) Em 1814 a Companhia de Jesus foi restaurada pelo Papa Pio VII. No entanto, os jesuítas só regressaram a Portugal em 1829. Por intermédio do rei D. Miguel, chegaram a Lisboa oito jesuítas que traziam como superior o belga P. Filipe José Delvaux. Abriram um noviciado e iniciaram actividades apostólicas entre a população de Lisboa e dos arredores. Em 1832, D. Miguel entregou-lhes o Colégio das Artes, em Coimbra, mas devido à guerra civil as aulas só se iniciaram no ano seguinte. Em 1834 o exército liberal ocupou Coimbra e os jesuítas foram presos e escoltados até Lisboa tendo ficado presos no forte de S. Julião da Barra donde partiram para Itália.
Planta do Forte de S. Julião da Barra. Do "Catalogus Provinciae Lusitana 1892" Nesta curta passagem por Portugal, o número de jesuítas foi de 24 e para além de terem retomado as actividades escolares, estiveram também empenhados em dar assistência aos feridos da guerra civil e às vítimas da epidemia de cólera que ocorreu em 1833.
TERCEIRO PERÍODO ( 1848 a 1910 ) O principal responsável por este regresso a Portugal foi Carlos João Rademaker, que tinha entrado para a Companhia de Jesus em Itália, em 1846.
CARLOS RADEMAKER Fotografia
existente no Arquivo da Cúria Provincial da Prov. Port. da Companhia de Jesus.
Rademaker veio para Portugal com o intuito de restaurar a Província de Portugal. Em 1858, deu início ao Colégio de Campolide, tendo tido a colaboração de mais dois jesuítas, um português ainda dos tempos de D. Miguel e um espanhol. Nos anos seguintes juntaram-se mais jesuítas principalmente vindos de Itália e abriu-se um noviciado no lugar do Barro. Em 1863, foi constituída oficialmente a Missão Portuguesa que teve como primeiro superior o italiano P. Francisco Xavier Fulconis. Ainda em 1863, os jesuítas tomaram conta do Orfanato de S. Fiel que transformaram em Colégio. No início de 1880, a Missão contava nove comunidades com 137 jesuítas. Estavam reunidas então as condições para ser restaurada a Província de Portugal da Companhia de Jesus. Os dois Colégios, Campolide e S. Fiel, além de outros importantes estabelecimentos de ensino, foram locais de intensa actividade científica. Em S. Fiel, em 1902, foi criada a revista Brotéria que, dirigida pelos professores do Colégio, publicava artigos de investigação nomeadamente nas áreas da botânica e da zoologia. Em relação à actividade missionária, os jesuítas tiveram uma difícil missão na Zambézia para onde foram enviados entre 1880 e 1910. Os jesuítas da Província de Portugal estiveram também presentes na Índia, Macau e Timor. Em Outubro de 1910 a Companhia de Jesus foi pela terceira vez expulsa e espoliada dos seus bens em Portugal. O ambiente de perseguição existia desde os últimos anos da monarquia, mas foi depois da revolução republicana que o governo provisório da República restaurou a lei pombalina de 1759. Os membros da Província de Portugal eram nessa altura 360. QUARTO PERÍODO ( DO EXÍLIO À ACTUALIDADE ) Depois de consumada a expulsão, a política seguida teve duas vertentes: em primeiro lugar, conservar na Europa o núcleo central da Província de Portugal, constituído pelas casas de formação e algumas residências. Em segundo lugar, reforçar as missões na Índia que, por se encontrarem em território inglês, podiam ser mantidas e, simultaneamente, procurar novos campos de actividade, principalmente no Brasil. Depois de temporariamente se terem instalado na Holanda e na Bélgica, as principais casas estabeleceram-se em Espanha: o noviciado, o juniorado e filosofado em Santa Maria de Oya, na Galiza, o Colégio para os alunos portugueses em La Guardia, no lado espanhol do rio Minho, a Escola Apostólica em S. Martinho de Trebejo e a redacção da revista Brotéria e do Mensageiro do Coração de Jesus em Pontevedra. Apesar do exílio, a Província de Portugal aumentou os seus efectivos. Em 1925 eram 380, 179 sacerdotes, 84 irmãos e 117 estudantes. A partir de 1923, abriram algumas residências em Portugal. As casas de formação e o Colégio de La Guardia regressaram em 1932. A Constituição de 1933 aboliu as leis de excepção por motivos religiosos, e o decreto de 12 de Maio de 1941, que reconhecia a Companhia de Jesus como corporação missionária, permitiram normalizar a situação jurídica dos jesuítas em Portugal. Durante os anos quarenta e cinquenta, os principais centros da presença dos jesuítas adquiriram o estatuto que ainda mantêm. Nos anos setenta, apesar de terem diminuído o número de efectivos, aumentaram a sua presença a Sul do Tejo, principalmente em zonas pobres e pertencentes à classe operária. Para além da educação, os jesuítas continuaram a publicação regular da Brotéria e surgiram novas revistas de investigação como a Revista Portuguesa de Filosofia e Economia e Sociologia. A publicação da Verbo. A Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, resultou da colaboração entre a editorial Verbo e as instituições culturais da Companhia de Jesus. Em relação à actividade missionária, os jesuítas estiveram sempre presentes na Índia portuguesa, até à anexação pela União Indiana, em 1961 de Goa, Damão e Dio. Expulsos da Índia, os jesuítas foram para Macau, Moçambique, Timor e Angola. A descolonização abalou profundamente a actividade missionária tendo muitos missionários, vítimas de inúmeras perseguições, tido que regressar à Europa. |
Olga Pombo: opombo@fc.ul.pt
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