"Se uma linha recta cortar duas outras
rectas de modo que a soma dos dois ângulos internos de um mesmo lado seja menor do que
dois rectos, então essas duas rectas, quando suficientemente prolongadas, cruzam-se do
mesmo lado em que estão esses dois ângulos." Próclo (410 - 485), criticou este postulado nos seguintes termos: "Este postulado deve ser riscado da lista, pois é uma proposição com muitas dificuldades que Ptolomeu, em certo livro, se propôs resolver... A asserção de que duas linhas rectas, por convergirem mais e mais à medida que forem sendo prolongadas, acabam por se encontrar, é plausível mas não necessária. (...) É claro, portanto, que devemos procurar uma demonstração do presente teorema, e que este é estranho ao carácter especial dos postulados." O próprio Euclides e
muitos dos seus sucessores tentaram demonstrar esta proposição a partir de outros
axiomas da geometria. Mas sempre em vão. Esta impossibilidade foi durante séculos o
escândalo da geometria e o desespero dos geómetras. O trabalho de Saccheri permaneceu ignorado durante século e meio. Outros grandes matemáticos, como Karl Gauss (1777 - 1855), o príncipe dos matemáticos, redescobriram e desenvolveram a geometria em bases semelhantes às de Saccheri (negando o quinto postulado), sem nunca chegarem a uma contradição.
"Estou cada vez mais convencido de que a necessidade da nossa geometria (euclidiana) não pode ser demonstrada, pelo menos não pela razão humana, nem por culpa dela. Talvez, numa outra vida, consigamos obter a intuição sobre a natureza do espaço que, no presente, é inantingível." Outros, mais ousados, não recuaram perante o estranho mundo novo que se abria a seus olhos. O jovem húngaro Janos Bolyai (1802 - 1860) admite a negação do postulado do paralelismo de Euclides como hipótese não absurda, isto é, como um novo postulado, a juntar aos postulados habituais da geometria absoluta. Pela mesma época, e trabalhando independentemente, o jovem russo Nicolai Lobachewski (1792 - 1856) publica em 1829 a sua versão da geometria não euclidiana à qual chama, primeiramente "imaginária" e depois "pangeometria". Actualmente, esta geometria é chamada Geometria Hiperbólica.
Por um ponto exterior a uma recta, podemos traçar uma infinidade de paralelas a esta recta (geometria de Lobachevski); Por um ponto exterior a uma recta não podemos traçar nenhuma paralela a esta recta (geometria de Riemann). Todos se deram então conta de que, substituindo o axioma das paralelas, era possível construir duas geometrias diferentes da geometria euclidiana, igualmente coerentes e que não conduziam a nenhuma contradição. Apesar de serem dificilmente concebíveis, estas duas novas geometrias foram a pouco e pouco reconhecidas como alternativas legítimas. Chegou-se mesmo a demonstrar que, se qualquer das duas pudesse apresentar alguma contradição, a própria geometria euclidiana seria também contraditória. Desde então, encontramo-nos perante três sistemas geométricos diferentes: A geometria euclidiana, por vezes também chamada parabólica; A geometria de Lobachevski, também chamada hiperbólica; A geometria do Riemann, também chamada elíptica ou esférica. As duas últimas recebem o nome de geometrias não euclidianas. Estas novas geometrias permitiram às ciências exactas do século XX uma série de avanços, entre os quais a elaboração da Teoria da Relatividade de Einstein (1879 - 1955). O que permitiu provar que essas teorias, ao contrário do que muitos afirmavam, tinham realmente aplicações práticas. De facto, conclui-se que o quinto postulado é o que distingue a Geometria não Euclidiana da Geometria Euclidiana.
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Olga Pombo: opombo@fc.ul.pt
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