Matemática

 

Euclides

 

No domínio da matemática, a figura soberana é Euclides(séc. III a.C.). Os pormenores da sua vida permanecem envolvidos numa nuvem de mistério. Aparentemente Euclides não estava em Alexandria em 332 A.C. quando Alexandre fundou a cidade nem terá chegado na década seguinte, quando a cidade começou o seu crescimento. Demetrius de Falero tê-lo-á convidado a vir para Alexandria por volta de 300 A.C. De acordo com o testemunho de Proclus, parece ser razoável acreditar que Euclides estudou em Atenas na Academia Platónica nos fins do século IV A.C. e que terá vivido em Alexandria sob o reinado de Ptolomeu Soter (306 - 283 a.C.). 

 Conhecem-se de Euclides muitas histórias, de autenticidade duvidosa, em geral provenientes de testemunhos dos seus alunos e colaboradores.

Conta-se por exemplo que, tendo Ptolomeu sentido dificuldades no estudo da geometria, terá perguntado a Euclides se não haveria uma maneira mais fácil de aprender geometria. Este, em resposta à observação do monarca, ter-lhe-á respondido: 

"não existem estradas reais para a geometria"

 

De qualquer modo, o nome de Euclides ficou ligado a Alexandria porque viveu e ensinou nesta cidade. Alguns estudiosos, como o inglês Ivor Bulmer-Thomas, consideram-no mesmo como o fundador no Museu de uma Escola de Matemática. Presume-se que Euclides deve ter trabalhado aí em problemas matemáticos,  quer reunindo um grupo de estudantes à sua volta, querem contactos pessoais com outros sábios que frequentavam o Museu. 

Euclides representado num baixo relevo de Giotto e Andrea Pisanodo campanáriodo Duomo de Florença

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Depois de Pitágoras, a geometria havia seguido dois caminhos paralelos.

Pitágoras

Um dos caminhos consistia no estudo pormenorizado de formas específicas, tais como triângulos, rectângulos e figuras limitadas por arcos de circunferência. A outra orientação consistiu no desenvolvimento dos métodos de demonstração. Coube a Euclides recolher todo o saber matemático, organizá-lo, suprimir lacunas, e introduzir novas noções. O resultado desse trabalho foi uma obra imortal Os Elementos , compêndio em treze livros, dos quais cinco dedicados à geometria de figuras planas, e três versando a geometria a três dimensões.  

  A obra constitui um monumento de incalculável valor científico e cultural. Pela primeira vez, a Matemática é apresentada de forma sistemática. Partindo de um conjunto de postulados e axiomas, Euclides deles deduz as várias proposições matemáticas.

POSTULADOS

AXIOMAS

1) Duas coisas iguais a uma terceira são iguais entre si. 1) Dados dois pontos, há um segmento de recta que os une.
2) Se parcelas iguais forem adicionadas a quantidades iguais, as somas continuarão a ser iguais. 2) Um segmento de recta a pode ser prolongado indefinidamente para construir uma recta.
3) Se as mesmas quantidades forem subtraídas de quantidades iguais, os restos continuarão a ser iguais. 3) Dados um ponto qualquer e uma distância qualquer pode-se construir um circulo de centro naquele ponto e com raio igual à distância dada.
4)Coisas que coincidem uma com a outra são iguais. 4)Todos os ângulos rectos são iguais.
5)0 todo é maior que as partes. 5) Se uma recta cortar duas outras rectas de modo que a soma dos dois ângulos internos de um mesmo lado seja menor do que dois rectos, então essas duas rectas, quando suficientemente prolongadas, cruzam-se do mesmo lado em que estão esses dois ângulos.

 Os Axiomas e os Postulados de Euclides

  

Os Elementos de Euclides chegaram até nós através de numerosas transcrições, sobretudo de copistas árabes, e tiveram um profundo impacto não apenas na matemática mas na construção da própria identidade lógica do mundo ocidental.

Os Elementos de Euclides segundo uma ilustração medieval

Arquimedes

Arquimedes nasceu em Siracusa mas foi educado em Alexandria tendo-se dedicado à matemática, mais especialmente à geometria. De regresso a Siracusa consagrou-se ao estudo da mecânica, conseguindo descobrir princípios e fazer aplicações que o imortalizaram. Na verdade, embora seja mais famoso pelo principio da hidrostática que trás o seu nome, bastavam as suas investigações sobre quadratura do círculo, ou seja, a descoberta da relação entre a circunferência e o seu diâmetro, para poder ser legitimamente consagrado como um dos grandes matemáticos de sempre.

Na verdade, Arquimedes foi o primeiro a descobrir que a  área de um círculo de raio R é dada pela expressão (p R2) , sendo p a relação entre o perímetro do círculo e o seu diâmetro. Daí deduziu várias fórmulas para calcular a superfície e o volume de uma esfera, de um cone e de uma pirâmide. 

? Como calculava Arquimedes o número p?

Se numa circunferência de raio R se traça um quadrado inscrito e outro circunscrito neste, a área do quadrado inscrito será de 2R2 e a do quadrado circunscrito 4R2 . Como a superfície do círculo há-de estar entre as superfícies de ambos os quadrados, pode concluir-se que p é um numero superior a dois e inferior a quatro. Se em vez de quadrados se traçarem pentágonos, os limites de p aproximam-se ainda mais, e ainda são mais próximos no caso de hexágonos, etc. Arquimedes empregou então um polígono de noventa e seis lados e sobre a base de determinados valores numéricos de aproximação, avaliou que p se situava entre 3,1407 e 3,1429. O numero certo arredondado era 3,1416.

Arquimedes soube também resolver um sistema de equações lineares com várias incógnitas e deduziu que, para multiplicar duas potências com a mesma base, se devem multiplicar os expoentes am x an= a(m+n).

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Os escritos de Arquimedes são verdadeiras memórias científicas, trabalhos originais, nos quais se dá por conhecido tudo o que foi descoberto antes sobre o tema e se apresentam elementos novos, fruto da sua originalidade e imensa produção científica.

De entre as principais obras de Arquimedes, destacam-se:

  • Da esfera e do cilindro – Um dos mais belos escritos de Arquimedes. Entre os seus resultados, a área do cone e do cilindro.
  • Dos conóides e dos esferóides - Sobre os sólidos que hoje designamos elipsóide de revolução, parabolóide de revolução e hiperbolóide de revolução.
  • Das espirais – Estudo monográfico de uma curva plana, hoje chamada espiral de Arquimedes, que se obtém por uma simples combinação de movimentos de rotação e de translação. Entre os resultados, encontra-se um processo para rectificar a circunferência.
  • Da medida do círculo – Contém apenas três proposições e é um dos trabalhos que melhor revela a capacidade matemática de Arquimedes.  Aí se combinam admiravelmente a matemática exacta e a aproximada, a aritmética e a geométrica, para impulsionar e encaminhar em nova direcção o clássico problema da quadratura do círculo.
  • Da quadratura da parábola – Escrito que oferece o primeiro exemplo de quadratura, isto é, da determinação de um polígono equivalente, de uma figura plana mistilínea: o segmento da parábola.
  • O Arenário –  Estudo no qual Arquimedes apresenta um sistema de numerações próprio, que lhe permite calcular e, sobretudo exprimir, quantidades enormes. Aqui surgem também uma série de considerações astronómicas de grande importância histórica, pois nelas se alude ao sistema heliocêntrico da antiguidade, devido a Aristarco de Samos.
  • Do equilíbrio dos planos – Primeiro tratado cientifico de estática. A alavanca, os centros de gravidade de alguns polígonos, entre outros resultados.
  • Dos corpos flutuantes (livro I e II) – Bases cientificas da hidrostática.
  • Do método relativo aos teoremas mecânicos – Aproximação extraordinaria dos conceitos actuais de cálculo integral.
  • O Stomachion – Jogo geométrico, espécie de puzzle, formado por uma serie de peças poligonais que completam um rectângulo.
  • O problema dos bois – Um problema referente à teoria do número  7.

 

Apolónio

Apolónio

   Apolónio de Pérgamo (262 - 190 a.C.) nasceu em Pérgamo, na Ásia Menor e viveu em Alexandria nos fins do século III a.C..Foi contemporâneo de Arquimedes e é unanimemente considerado como um dos mais originais e profundos matemáticos de sempre.

A sua obra mais famosa é o Tratado sobre as cónicas (o primeiro estudo sistemático das cónicas), aí definidas como secções de um cone de base circular e designadas por elipse, parábola e hipérbole. 

Dos oito livros do tratado, apenas um se perdeu, representando esta obra, segundo alguns autores, o ponto máximo alcançado pela matemática grega. É motivo de admiração a mestria com que Apolónio demonstra centenas de teoremas, recorrendo aos métodos puramente geométricos de Euclides.

As Cónicas de Apolónio

Enquanto Menaichmos, um matemático da escola de Atenas que repartiu os seus ensinamentos até 350 a.C., julgava que estas curvas se obtinham por meio de cortes efectuados sempre em ângulo recto em relação à superfície do cone e que assim se obtinham diferentes tipos de curva para diferentes ângulos de abertura do cone, Apolónio achou que os quatro géneros de curvas se obtinham cortando um mesmo cone sob diferentes ângulos.  

Foi também Apolónio quem apresentou, pela primeira vez, muitas das propriedades das cónicas. Por exemplo: se um ramo de uma hipérbole intersecta os dois ramos de uma outra hipérbole, o ramo oposto da primeira hipérbole não encontrará nenhum dos ramos da segunda em dois pontos.

 

Diofanto

Diofanto de Alexandria, que viveu na Segunda metade do século III A.C., teve uma grande importância no campo das representações geométricas de formulas algébricas. Antes de Diofanto era costume representar geometricamente todas as formulas matemáticas. Assim, nos livros de Euclides, encontram-se exemplos como o da figura abaixo para ilustrar o teorema.

 

(a + b)2 = a2 + 2ab + b2

Ao libertar as matemáticas da necessidade de uma interpretação geométrica das afirmações matemáticas, Diofanto converteu-se no fundador da álgebra e do cálculo simbólico.

  Hipátia 

Hipátia

Entre os génios matemáticos da Antiguidade encontra-se ainda Hipátia(370 - 415 d.C.), a primeira grande matemática da qual se tem conhecimento. Sabe-se que seu pai, Teon, eminente professor do museu (do qual mais tarde se tomou director), foi simultaneamente seu tutor, seu professor e seu companheiro. 

Hipátia teve uma esmerada educação que para além de um cuidado treino físico diário, incluiu arte, ciência, literatura e filosofia. A oratória e a retórica, com grande importância na época, também não foram descuradas. No campo religioso, Hipátia recebeu informação sobre todos os sistemas de religião conhecidos, tendo seu pai Teon assegurado que nenhuma religião ou crença lhe limitasse a busca e construção do seu próprio conhecimento. Depois de ter viajado pelo mundo, Hipátia regressa a Alexandria. É convidada para dar aulas no Museu, ao lado  daqueles que haviam sido seus professores.

? O que representaria, para uma mulher, naquela época, alcançar um lugar entre os mais ilustres sábios e ser respeitada por eles ?

Hipátia é um marco da História da Matemática que poucos conhecem, tendo sido equiparada a Ptolomeu, Euclides, Apolónio, Diofanto ou Hiparco. A sua paixão pela matemática, a sua inteligência brilhante reflectia-se nas suas aulas, que atraiam estudantes de várias partes do mundo.

Porém, do seu trabalho, pouco chegou até nós. Alguns tratados foram destruídos com a Biblioteca, outros, quando o templo de Serápis foi saqueado. Sabemos que desenvolveu estudos sobre a álgebra de Diofanto (Sobre o canon astronómico de Diofanto), que escreveu um tratado sobre as secções cónicas de Apolónio (Sobre as cónicas de Apolónio) e que, em colaboração com o pai, terá escrito um tratado sobre Euclides.

Um notável filósofo, Synesius de Cirene (370 - 413 d.C.), foi seu aluno e escrevia-lhe frequentemente pedindo-lhe conselhos sobre o seu trabalho. Através destas cartas ficámos a saber que Hipátia inventou alguns instrumentos para a astronomia (astrolábio e planisfério) e aparelhos para a física, entre os quais um hidroscópio.

 

Olga Pombo opombo@fc.ul.pt