Nota Introdutória

 

    Descartes sentiu, desde muito cedo, o desejo de conhecer a natureza, o homem e o universo. Foi após ter terminado os seus estudos, que se apercebeu da sua ignorância.

    “Alimentei-me das letras desde a minha infância, e porque me tinham persuadido de que, por meio delas, se pode adquirir um conhecimento claro e seguro de tudo quanto é útil à vida, tinha um enorme desejo de as aprender. Mas, logo que terminei todo este curso de estudos, no termo do qual é costume ser-se acolhido na categoria dos doutos, mudei completamente de opinião. Pois encontrava-me embaraçado com tantas dúvidas e erros que me parecia não ter tido outro proveito, ao procurar instruir-me, senão o de ter descoberto cada vez mais a minha ignorância. E, no entanto, estivera numa das mais célebres escolas da Europa (...).”

Descartes, Discurso do Método, I Parte, Lisboa, Ed. Mar. Fim, 1989, p. 13.

     Descartes estava, de facto, decepcionado com o ensino que lhe havia sido ministrado. Não era tanto o método de ensino que estava em causa mas os conteúdos e a desarticulação curricular entre as várias disciplinas leccionadas.

    Para além de sentir que o seu conhecimento não era coerente, recusou a lógica  como processo ideal de investigação do saber. A lógica aristotélica aparecia-lhe incapaz de permitir o progresso do conhecimento. Ora, para Descartes, a função da filosofia é o aumento gradual do conhecimento, a busca de um saber  unitário e universal, ou seja, atravessado por uma mesma estrutura matemática.

    Influenciado pela filosofia do Renascimento, mas ligado ainda à filosofia medieval, Descartes foi um adepto intransigente do vigor, da clareza e da disciplina metódica. Nesse sentido, a sua obra tem como ponto de arranque a dúvida universal, que se institui como método e critério da verdade. Duvidando de todos os conhecimentos adquiridos, duvidando da sua própria existência, Descartes chega à evidência de uma verdade que não pode negar: o seu próprio pensar, a realidade do sujeito pensante que se torna assim no arquétipo da ideia clara e distinta - «penso, logo existo».

    Grande matemático, inventor da geometria analítica, restaurador do interesse pela metafísica na sua época, os problemas e questões por ele levantados abriram caminho a um dos períodos mais florescentes da ciência e da reflexão filosófica na história da Humanidade.

    Das suas inúmeras obras, científicas e filosóficas, destacamos as seguintes:

   

    Compêndio de Música (redigida em 1618 e publicada postumamente);

    Primeiros Pensamentos (obra só conhecida por referências indirectas);

    Exercício do Bom Senso (obra perdida, possivelmente do

período 1620-1625);

    O Mundo ou Tratado da Luz (obra inacabada, publicada em 1644 com o título de O Mundo);

    O Homem (publicada em 1644);

    Discurso do Método (seguido dos três Ensaios Dióptrica, Geometria, Meteoros, publicados em 1637);

    Meditações sobre Filosofia Primeira...(Meditações Metafísicas) (publicado em 1641; sete séries de Objecções seguidas das respectivas Respostas de Descartes);

    Princípios de Filosofia (publicado em 1644);

    As Paixões da Alma (publicado em 1649);

    A Busca da Verdade pela luz natural (texto inacabado, com data desconhecida, encontrado após a morte do filósofo);

    A imensa Correspondência de Descartes começa a ser publicada a partir de 1657.

   

 

       

Capa de As Paixões da Alma

 

 

 

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Olga Pombo opombo@fc.ul.pt