5. O Liceu Depois de Aristóteles

Quando Aristóteles deixa a sua escola partindo para Cálcis, depois de nela ter ensinado durante cerca de doze anos, esta fica ao cuidado do seu discípulo Teofrasto, que toma a direcção da escola durante cerca de trinta e cinco anos, até 287 a.C., data da sua morte.

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Teofrasto

Sob a liderança de Teofrasto, o Liceu assumiu uma faceta pública. O estado macedónico havia nomeado Demétrio, membro da escola Peripatética, como ditador de Atenas. Das acções governativas levadas a cabo por Demétrio sabe-se que " ele desempenhou muitos e esplêndidos serviços públicos pelo seu país e enriqueceu a cidade com avenidas e edifícios" (Diogenes Laertius V,75, cit. in Patrick, 1972). De entre os planos para favorecimento da cidade, Demétrio mostrou especial interesse pelo restabelecimento do Liceu. Diz-se que,  numa atitude que denota uma certa rivalidade para com a escola de Platão, teré mesmo oferecido um jardim a Teofrasto.

A fortuna pessoal de Teofrasto, sem dúvida um pré-requisito necessário para a liderança de uma escola como o Peripatos, é também evidente no seu testamento. Teofrasto não só possuía terra e dinheiro, como também menciona ao longo do documento o facto de possuir escravos.  Estava pois em condições para levar a cabo obras de reconstrução de edifícios e ampliação das instalações. Sabe-se que Teofrasto organizou no Liceu um Museu, com salas de aulas, alojamentos para os alunos e professores e dependências onde era conservada a famosa biblioteca de Aristóteles.

O sucesso e o progresso na escola de Aristóteles e Teofrasto dependia em grande parte da acumulação e classificação de livros e materiais de pesquisa. Situação que, por sua vez,  dependia da existência de instalações de armazenamento amplas e seguras. Dadas estas necessidades, o Liceu foi crescendo em termos de ocupação de terrenos e edifícios. Mas, a partir do momento em que perdeu mobilidade, o sucesso do Liceu passou a estar dependente da paz. A última parte do século IV a.C. e os primeiros anos do século III a.C. foram pouco pacíficos em Atenas e, como tal, a história ateniense vai revelar-se adversa aos trabalhos que Aristóteles e Teofrasto desenvolveram no Liceu. Através do testamento de Teofrasto, é possível compreender os efeitos que os eventos que decorrem em Atenas tiveram sobre a escola. Este resultado pode ser deduzido de vários pedidos que Teofrasto faz no sentido de serem feitos reparos em algumas partes do complexo escolar que haviam sido destruídas. 

Por outro lado, o Lyceum estava numa posição favorável para crescer e prosperar enquanto Demétrio detivesse o poder em Atenas. Contudo, em 307 a.C. o seu reinado teve um final abrupto quando Atenas foi tomada de assalto pelo exército de Demétrio Poliorcetes, tendo o ditador peripatético sido obrigado a exilar-se.

A vingança contra a comunidade peripatética fez sentir os seus efeitos de imediato, dadas as fortes ligações com a Macedónia. O novo líder anti-macedónico quis mesmo aprovar uma lei segundo a qual todos os filósofos estavam proibidos de dirigir ou liderar escolas. Apesar desta lei se dirigir a todas as instituições de ensino superior atenienses, não resta dúvida alguma de que a sua acção visava particularmente o Lyceum. Como resultado, Teofrasto e todos os outros filósofos foram forçados a abandonar Atenas.

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Pormenor de um papiro com constituição de Atenas redigida por Aristóteles.

Contudo, nesse mesmo ano (306 a.C.) deu-se o reverso desta situação. Um aluno de Aristóteles, Filon, conseguiu demonstrar a ilegitimidade da lei e levar os atenienses a invalidá-la e a votar o regresso dos filósofos para a cidade, "para que Teofrasto pudesse voltar e viver nas mesmas condições em que tinha vivido anteriormente". A escola Peripatética conseguiu, deste modo, sobreviver à mudança de governo que se deu em 307 a.C...

O período de esplendor do Liceu não excede o da direcção de Teofrasto a quem sucedeu Estratão, que liderou a escola de 287 a 269 a.C. No entanto, Teofrasto parece ter protegido Neleu ao entregar-lhe a biblioteca de Aristóteles que Neleu, talvez desapontado com o facto de não ter sido escolhido para escolarca, levou para a sua cidade natal. Ora. a perda da biblioteca que continha os livros de Aristóteles e de Teofrasto deve ter representado seguramente um rude golpe para uma escola inteiramente orientada para a acumulação e classificação dos conhecimentos. 

Resistindo a inúmeras pilhagens e a uma destruição parcial em 84 a.C., o Liceu manteve-se activo, pelo menos, até ao sec. III d.C.. Consta que terá sido definitivamente encerrado  no ano de 529 d.C., por ordem do imperador Justiniano I.

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Olga Pombo opombo@fc.ul.pt