A fundação do Museu deve-se a Ptolomeu I, a quem os Rodiotas cognominaram Sóter (Salvador) em virtude da ajuda que lhes prestou. Homem de confiança de Alexandre Magno, general e historiador, foi ele quem, depois da morte de Alexandre, estabeleceu para si e para seus sucessores um novo reino no Egipto. Decidido a transformar Alexandria na capital intelectual do helenismo,
Ptolomeu vai procurar retirar a hegemonia cultural a Atenas em favor da sua capital,
convidando poetas, sábios e filósofos. Assim, consegue atrair à sua cidade alguns
poetas, médicos ilustres, matemáticos e astrónomos. Apesar de serem os filósofos quem
ele mais desejava conquistar (estes, ao lado dos diádocos,
e das cortesãs, eram considerados as grandes vedetas da época) o seu êxito no campo da
filosofia não foi tão grande. Desta forma, os representantes das principais
escolas filosóficas da época, cinismo, estoicismo e o
epicurismo,
não atenderam ao convite de Ptolomeu. Apenas um dos representantes da escola peripatética,
Demétrio de Falero, discípulo
de Teofrasto, aceitou o seu
convite. Demétrio de Falero tinha
governado Atenas durante dez anos, em nome de Cassandro da Macedónia. Com a morte de
Cassandro, muda-se para Alexandria onde é incumbido de desenvolver a cultura das letras,
das ciências e das artes. Será Demétrio de Falero o responsável pela criação do
Museu e da Biblioteca. Este intenso desenvolvimento cultural vai manter-se ao longo das
gerações seguintes. De um modo geral, todos os elementos da dinastia dos Ptolomeus se
distinguiram pela protecção concedida aos homens da cultura. Antecedentes do Museu Na realidade, a ideia e o
nome do Museu não eram novas. Elas remontam fundamentalmente à escola peripatética a
que Demétrio de Falero pertencera. A ideia provém de Pitágoras que
fundou uma espécie de confraria na qual o culto das Musas simbolizava o estudo e a
investigação científica. Às casas pitagóricas chamavam-se museus. Por seu lado,
Platão (427 - 347 a.C.) ao fundar a Academia em Atenas, numa sua propriedade
pessoal, aí instalou parques para passeio, salas de estar para o diálogo, instalações
para o director e também uma parte para os alunos. O episódio fundamental é porém a fundação do Liceu de
Aristóteles cuja orientação metodológica pressupõe a cooperação dos sábios na
investigação científica do Mundo. Após a morte de Aristóteles, Teofrasto
organiza no Liceu um Museiom, verdadeiro
predecessor do Museu de Alexandria. Neste Museiom, podiam-se
encontrar salas de aula, alojamentos para os professores e também a famosa biblioteca
reunida por Aristóteles. Digamos que o projecto de
Aristóteles e de Teofrasto era já o de agrupar os sábios e os alunos em redor de uma
biblioteca, com vista a uma colaboração útil para o progresso da ciência. Em
Alexandria, Demétrio, ele mesmo um peripatético, retoma a ideia conferindo-lhe, contudo,
um carácter mais amplo. Busto de Teofrasto Ainda que Pfeiffer (1968) chame a atenção para a origem estritamente medieval da palavra Universidade, é possível afirmar que o Museu de Alexandria foi, de alguma forma, a primeira Universidade da História da Humanidade pois, para além de ser uma escola, foi o primeiro verdadeiro instituto de investigação da história do Mundo. Como diz Carl Sagan (1980: 28):
"Este lugar foi em tempos o cérebro e a glória da mais importante cidade do
planeta, o primeiro instituto de investigação da história do mundo".
As Instalações do Museu
Pouco se sabe acerca dos
edifícios e da organização arquitectónica do Museu. Os arqueólogos nunca encontraram
os suas ruínas e apenas o conhecemos através das descrições de escritores antigos. Pensa-se que Hecateu
de Abdera, contemporâneo de Ptolomeu Soter, ao descrever a planta do túmulo de
Ramsés II, pretendia revelar alguns aspectos da planta do Museu. São suas estas palavras:
Reconstituição de um dos átrios da Biblioteca de Alexandria,
tal como é apresentado no Cosmos de Carl
Sagan Os dois quadros representam, à
esquerda Alexandre, e à direita o deus
Serápis. De acordo com Canfora (1989: 16), Hecateu colocou no mesmo plano
a antiga realeza egípcia e a nova realeza ptolomaica. Tal como o túmulo de Ramsés, o
Museu seria constituído por um perípato, um refeitório colectivo e uma sala de
refeições. Incluiria também uma sala circular, em torno da qual se situavam os
aposentos dos sábios residentes no museu. Também Estrabão, historiador e geógrafo grego (63 a.C. - 20 d.C.) ao
falar de Alexandria, inclui uma descrição precisa do Museu:
O Funcionamento do Museu De acordo com
Pfeiffer (1968) os sábios não seriam obrigados a ensinar mas, provavelmente, todos o
fariam. O clima entre professores e alunos seria de companheirismo. Como forma de manifestar o seu apreço pelo Museu,
Ptolomeu visitava-o com frequência, participava nas refeições comunitárias assim como
nos debates dos sábios, aceitando sempre de bom grado qualquer observação crítica. Ser admitido no Museu representava uma grande distinção. Nem todos os
homens da ciência, ou que se tomavam como tal, receberam semelhante honra. Não se sabe
muito bem o número de alunos que existiam nesta instituição, pensando-se que deveriam
ser por volta de algumas centenas. As condições em que se desenvolviam os estudos eram para a época
insuperáveis, vindo a ter um significado histórico universal. Segundo se pensa, o Museu
era constituído por dez laboratórios de investigação (cada um deles dedicado a um
assunto diferente), jardins botânicos, um jardim zoológico, salas de dissecação e um
observatório. A direcção do Museu estava
entregue a um grande sacerdote das musas (esta instituição tinha carácter religioso) e
a um presidente que se ocupava da parte administrativa. Mas a glória do Museu era, sem dúvida, a sua magnífica Biblioteca. |
Olga Pombo: opombo@fc.ul.pt
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