Contexto Educativo Ateniense   

 Educação Tradicional Insuficiente | Sofista Versus Grammatistés
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Contexto Educativo

  
  

      Somos herdeiros dos gregos e depositários estéticos do seu legado cultural. Na sua actividade racional e nos seus ideais se encontram algumas das nossas raízes culturais mais profundas. A nossa cultura europeia ocidental é o produto do cruzamento de algumas linhas de força essenciais: a inteligência grega, o direito romano e a religião cristã.

a Platão e Aristóteles

      É também com os gregos que o problema educativo se coloca, ou seja, é com os gregos que a educação se põe como um problema decisivo para o destino do homem.
      O homem só é homem pela educação e só vale pela educação! Os gregos tinham isto bem presente. Homem e educação encontram-se inevitavelmente vinculados. Não é pois de estranhar que os gregos tenham dado forte atenção à educação. 

     É comum considerar-se que há dois períodos na história da educação grega: o período antigo, que compreende a educação homérica e a educação antiga de Atenas e de Esparta, a Paideia, e o novo período, o da educação do "Século de Péricles". Período áureo da cultura grega, ele inicia-se com os sofistas e desenvolve-se com os filósofos/educadores Sócrates, Platão e Aristóteles.
     Seguir-se-á depois o período helenístico, de decadência política, em que a Grécia é conquistada, primeiro pelos Macedónios e depois pelos Romanos. Atenas perde, então, a sua posição de centro cultural do mundo em favor de Alexandria.

Paideia

      O modelo educativo que existia em Atenas antes do aparecimento dos sofistas, por volta do séc. V a.C., era a Paideia. O seu ideal residia numa educação humanista, não especializada nem marcadamente técnica. A Paideia era entendida como cultura geral, ou formação geral que convinha ao homem, enquanto homem livre e cidadão.

      O que se pretendia atingir era a kalokagathia, a realização de dois atributos fundamentais: a bondade e a beleza. Acreditava-se que a bondade era resultado de um firme e equilibrado domínio de si e a beleza era capaz de representar exteriormente a serena ordem interior da alma.

A ginástica    A ginática

      Para alcançar tal ideal propõem um programa que, de início, suportava dois elementos: a ginástica, para desenvolver o corpo, e a música para o espírito. Com o professor de música, o kitharistés, a criança memorizava e recitava as obras dos grandes poetas, tais como Homero e Hesíodo, considerados extremamente importantes para a sua formação moral.

A Aula de Música

      Pensava-se que, o facto destas obras serem apresentadas em forma de composições musicais, permitia introduzir o ritmo e a harmonia no interior da alma dos jovens, para que estes conseguissem desenvolver um domínio sobre si próprios, a sophrosyne.
      Quanto à ginástica, o jovem é levado ao ginásio, onde o paidotribés é encarregado de lhe fortalecer o corpo, que se deve converter no servo fiel de um espírito vigoroso e para que o jovem nunca fracassasse na vida por debilidade física.

Não é possível visualizar!   

      Mais tarde, surge a figura do grammatistés que ensinava a ler e a escrever e também as primeiras noções aritméticas.
      Cerca dos 18 anos, depois de terem frequentado o ginásio e as palestras particulares do kitharistés e do grammatistés era suposto que os jovens tivessem adquirido todas as competências morais e cívicas adequadas, estando aptos para aprender tudo o que dizia respeito à polis, passando a intervir, directamente, nos assuntos políticos da cidade. Desde esta altura passavam a acompanhar os seus pais nas várias reuniões ou encontros em que estes participavam, com o objectivo de tomarem contacto com a vida da cidade.

 

      Além disto, os jovens ou homens já adultos continuavam a ir ao ginásio, para fazer manutenção física ou, simplesmente, para conversar e estabelecer relações e contactos com outros cidadãos. Desta forma, o ginásio era, um importante local de convívio e intercâmbio de ideias.

a Ruínas de um Estádio em Olympia

      Assim se explica que os sofistas incluíssem os ginásios entre os locais escolhidos para a epideixes, como mais tarde teremos ocasião de referir.

      Este era, em traços bastante gerais, o contexto educativo que se vivia em Atenas no início do séc. V a.C.. No entanto, os sofistas vieram alterar esta situação. De facto, o que afirmavam era que a educação não estava completa com a Paideia, como habitualmente se pensava! Era necessário que os jovens adquirissem determinados conhecimentos ou capacidades, como a areté política, por exemplo, que eles afirmavam estar aptos a ensinar em troca de dinheiro.
Já não era suficiente a honra e glória dos tempos homéricos, mas era preciso alcançar a excelência tanto a nível moral como a nível físico. Assim os sofistas proclamam-se professores da areté política e o seu objectivo será ensinar a melhor forma de aceder ao poder e a melhor maneira de triunfar nesse domínio.
       Foram os sofistas os primeiros a ministrar um nível de educação superior, manifestando claramente a convicção de que "a educação não acaba com a saída da escola. Em certo sentido poderia dizer-se que é precisamente nessa altura que ela principia" (Jäeger, 1986: pág.361).

  Contexto Educativo | Sofista Versus Grammatistés
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O modelo educativo visto como insuficiente para a 
 preparação dos jovens para a vida pública

  
Diskobolos  

      A consciência da cidadania cedo fez sentir a necessidade de uma nova educação. O tradicional modelo educativo, com o seu receituário básico, simples e elementar, de ginástica e música, já não servia para a formação do cidadão, nem correspondia às novas necessidades individuais nem às novas exigências sociais e políticas.

 


   "Ora bem, Hipócrates, talvez não te pareça semelhante o ensino que vais encontrar junto de Protágoras e aquele que recebeste junto dos professores das primeiras letras, de cítara e de ginástica. Com efeito, estudaste cada uma dessas disciplinas não como uma técnica, para te tornares um profissional, mas para teres cultura, como convém ao leigo e ao homem livre".

Protágoras, Pinheiro (1999): pág.80 

      Como refere esta citação do diálogo "Protágoras" de Platão, a Paideia não pretendia preparar para uma profissão, mas sim cultivar o homem livre. No entanto, aos poucos, começava a tornar-se evidente em Atenas a necessidade de preparar para o exercício do poder político, e o homem mais poderoso não era o atleta, nem o músico, mas aquele que melhor soubesse falar em público e convencer as assembleias a votar os seus pontos de vista. 

      Situado no coração da polis, o homem quer vencer na vida política, quer fazer valer os seus interesses ou convicções, quer ganhar um lugar de destaque, quer ser eleito para cargos públicos, quer ser governante e aceder ao poder.
      Mas, para ter êxito político, precisa de saber falar bem, de encantar o auditório, de construir discursos persuasivos, de formular os argumentos que justifiquem e validem as suas posições, fazendo-as prevalecer como as melhores. Numa palavra, precisa da arte da oratória, da retórica e da dialéctica.

      Estas habilidades eram fundamentais mas não haviam mestres para as ensinar! É neste contexto que se compreende ter surgido uma nova estirpe de "educadores" que, a troco de dinheiro, oferecem o ensino da areté política ou a techné política, como lhe chamam os sofistas.
 

  Contexto Educativo | Educação Tradicional Insuficiente
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O sofista versus o grammatistés

 
       Como já referimos, o grammatistés ensinava os alunos a ler, a escrever e conhecer os rudimentos da aritmética. Este trabalho tinha por base a memorização de algumas obras que os gregos viam como referência moral e que as crianças, através do encanto e da admiração, deviam esforçar-se por respeitar, aceitar e cumprir as disposições morais nelas representadas.
      De uma maneira geral, o grammatistés preocupava-se com a formação literária e moral das crianças.

O Grammatistés com os alunos

      Pelo contrário, o sofista, procurava dotar o jovem de determinados atributos que considerava constituírem a chave para o seu sucesso na vida pública da cidade. O seu objectivo não era tanto o de formar a consciência do jovem num ideal comum, mas sim proporcionar-lhe meios para que este se pudesse distinguir dos outros, intensificando a sua influência e poder na sociedade.

      Assim, ao contrário do grammatistés que fornece uma componente geral, o sofista é perito numa determinada técnica e, como tal, "vende" essa técnica a quem procurar adquiri-la. 

Sofista com um aluno  

      Eles sabem como fazer belos discursos, como manejar a palavra, como convencer, como argumentar... O que pretendem ensinar tem uma finalidade utilitária.

      Não querem resultados a "longo prazo" (como é o objectivo dos grammatistés, uma vez que pretendem o desenvolvimento da consciência moral dos jovens, de concretização bastante longa). Preferem, acima de tudo, preparar para o alcance do poder, de forma rápida e eficiente, por parte daqueles que o ambicionam.

   

  

    Não é possível visualizar!

Olga Pombo opombo@fc.ul.pt