A utilização de fracções é, indubitavelmente, o aspecto mais peculiar da matemática egípcia. O método usado pelos escribas egípcios para operar com fracções é bastante mais complicado que o actual. A base da representação de uma fracção encontrava-se na sua decomposição como soma de fracções unitárias (fracções de numerador 1), todas distintas. Na representação de fracções utilizava-se o símbolo (que em hierático se convertia num ponto) e que significava “parte”. Quando se queria escrever um número fraccionário, representava-se o símbolo anterior seguido do valor numérico do denominador. Por exemplo:

  = 1/5  (hieroglífico)    = 1/5 (hierático)

 

As únicas excepções que havia a esta representação eram as fracções 1/2, 2/3, 1/4 e 3/4, que se representavam com um hieróglifo especial:

 , , ,

Em aritmética usavam-se somente as fracções unitárias e a fracção 2/3, que em hierático se representava por .

Era também muito frequente o uso das fracções denominadas por fracções do olho de Horus, que representavam cada uma das partes em que foi seccionado o olhos de Horus durante a batalha com Seth.

As fracções com numerador diferente da unidade reduziam-se a somas de fracções conhecidas, unitárias, todas distintas. Assim, Ahmes no papiro de Rhind escreve 2/5 como 1/3+1/15 e nunca se poderia escrever como 1/5+1/5. A própria expressão 2/5 não tinha sentido no pensamento egípcio. O símbolo “+” não se aplicava e as fracções apareciam sequencialmente. Logicamente, o grande problema era encontrar estas decomposições das fracções. Actualmente conhecemos e podemos encontrar algoritmos de cálculo que nos permitem tais adições, contudo, há 4000 anos os escribas não tinham conhecimento destes métodos rápidos e eficientes. Deste modo, limitavam-se a utilizar tabelas de decomposição já escritas e a efectuar o processo de divisão conhecido. Quando um egípcio encontrava uma fracção como 5/8 não pensava ‘como poderei escrever 5/8 como soma de fracções unitárias?’, limitava-se sim a dividir 5 por 8 utilizando a técnica conhecida para este tipo de fracções.

O papiro de Rhind inclui, no início, uma tabela em que se expressam todas as fracções de numerador 2 e denominador ímpar entre 5 e 101 como soma de fracções unitárias. Obviamente, não aparecem as fracções em que o denominador é par.

É provável que a tabela escrita por Ahmes não fosse produto de métodos empíricos, mas produto de alguns raciocínios lógicos. Vários investigadores ao analisarem a tabela tiraram algumas conclusões acerca do sistema de decomposição:

            todas as fracções da forma 2/3k estão expressas como soma de fracções unitárias da forma 1/2k+1/6k.

             todas as fracções da forma 2/5k são decompostas em 1/3k+1/5k, exceptuando a fracção 2/95 (k=19) que aparece decomposta como 1/60+1/380+1/570.

Estes dois exemplos não são únicos, e através da análise desta tabela muitos investigadores acreditam que os egípcios possuíam métodos eruditos na decomposição de fracções em soma de fracções unitárias. No entanto, não há nenhum documento conhecido que apresente esses métodos como tendo sido conhecidos no Egipto.

Poderíamos pensar que o modo mais óbvio para decompor as fracções da forma 2/n seria como 1/n+1/n. Todavia, os egípcios nunca empregavam fracções iguais na decomposição. Ahmes reduz todas as fracções a soma de fracções de numerador 1 e 2. Assim, para exprimir a fracção 7/29 (exemplo dado no papiro de Rhind) o escriba escreve 7 como 2+2+2+1 e aplica a tabela para saber a decomposição de 2/29. Com as substituições correspondentes e as posteriores adições obtém-se 7/29=1/6+1/24+1/58+1/87+1/232.  

Mas porque usavam, os egípcios, as fracções unitárias nos seus cálculos?

Existem várias teorias para justificar este tipo de fracções, mas a mais convincente é a que refere a facilidade em dividir a unidade por n partes. Por exemplo, se tivermos 3 pães e os quisermos dividir por 5 pessoas, aceitamos facilmente que a cada pessoa corresponde 3/5 do total, mas se aplicarmos o método das fracções unitárias a 3/5 obtemos 3/5 = 1/3 + 1/5 + 1/15, ou seja, para dividirmos os pães, dividimos um em três partes iguais, outro em 5 partes iguais e o último em 15 partes iguais.