Os algarismos na civilização suméria

 

    A . De origem desconhecida (vinda provavelmente da Anatólia e chegada à Mesopotâmia por volta de 3300 a.C), a civilização Suméria é a mais antiga civilização.  No extremo sul da Mesopotâmia, entre os rios Tigre e Eufrates (área onde posteriormente se desenvolveu a civilização  Babilónica  que hoje corresponde ao sul do Iraque, entre Bagdad e o Golfo Pérsico), aí floresceram cidades-estados (Ur, Eridu, Lagash, Uma, Adab, Kish, Sipar, Larak, Akshak, Nipur, Larsa e Bad-tibira)

    A crescente rivalidade entre as cidades enfraqueceu esta civilização, tornando-a extremamente vunerável a invasores. Depois de 1900 a.C., após a conquista de todo o território mesopotâmio pelos amorritas, os sumérios perderam a sua identidade como povo, mas a sua cultura foi assimilada pelos sucessores semitas.

    De entre os feitos desta civilização destacam-se a invenção da escrita cuneiforme (a mais antiga forma registada para representar sons da língua, em vez dos próprios objectos), os primeiros veículos sobre rodas e os primeiros tornos de cerâmica.

    A escrita cuneiforme surgiu na Mesopotâmia por volta de 3000 a.C., sendo utilizadas para seu registo tábulas de argila e estiletes de bambu. Graças a esta escrita, decifrada no século XIX por linguístas e arqueólogos, foi possível conhecer inúmeros aspectos da vida, religião e instituições desta civilização.

 

O sistema sexagesimal

 

    Na civilização suméria utilizavam-se dois  sistemas de contagem diferentes: um na base 5 e outro na base 12.

    A base 5 resumia-se à utilização dos dedos das mãos como processo de contagem, servindo-se de uma mão para contar e da outra como auxílio a contagens de maior dimensão, para "armazenar" a quantidade dos "cincos" contados.

    A base 12 assentava na utilização das três falanges que compõe cada um dos dedos, usando o polegar como auxiliar de contagem (apoiava-se o polegar em cada uma das falanges, sendo assim possível a contagem até 12).

    Na sequência de uma combinação entre os dois sistemas manuais de contagem, surge a base 60. Esta nova técnica de contagem era praticada da seguinte maneira: na mão direita, contam-se as falanges, tal como na base 12, "guardando" o número de contagens na mão esquerda, assim como na base 5.

    Esta é uma das muitas hipóteses que existem acerca da origem do sistema sexagesimal, sistema este que constituiu um dos maiores méritos da cultura suméria.

 

Mão esquerda              Mão direita

Contagem dos dedos, cada um valendo uma dúzia.

Contagem das falanges pelo polegar oposto, cada.

      Sistema de contagem sexagesimal.

 

   É importante frisar que ainda é notório, na nossa cultura, a utilização deste sistema, quer por exemplo na expressão das medidas do tempo, em horas, minutos e segundos, ou a dos arcos e ângulos em graus, minutos e segundos.

 

A evolução gráfica dos algarismos

 

    Os mais antigos algarismos conhecidos da história são representados através de marcas de baixo relevo que correspondem às diferentes classes de unidades consecutivas da numeração escrita suméria. Assim, a unidade era representada por um entalhe fino, a dezena por uma impressão circular de pequeno diâmetro, a sessentena por um entalhe grosso, o número 600 por um a combinação de dois algarismos precedentes, o número 3600 por uma grande impressão circular e o número 36.000 por essa última munida de uma pequena impressão circular.

    Essa sequência era obtida da seguinte forma:

1

10

60=10×6

600=(10×6)×10

3600=(10×6×10)×6

36000=(10×6×10×6)×10

 

    Cerca do século XXVII a. C., estes algarismos foram alterados, passando a estar dirigidos para a direita, em vez de estarem  dirigidos para baixo, conforme ilustra a figura:

1

10

60

600

3 600

36 000

 Forma dos algarismos sumérios arcaicos após uma rotação de 90º

    Com a evolução da escrita cuneiforme, estes algarismos voltaram ser a alterados, passando a ter formas diferentes: a unidade era representada por um pequeno prego vertical, a dezena por uma viga, a sessentena por um prego vertical de maior dimensão, o número 600 por um prego vertical do tipo precedente associada a uma viga, o 3600 por um polígono formado pela reunião de quatro pregos, o número 36000 por um polígono do tipo precedente, munido de uma viga e por fim o número 216000 combinando o polígono de 3600 com o prego da sessentena.

 

  1 10 60 600 3 600 36 000 21 600
ALGARISMOS ARCAICOS (conhecidos desde 3 200 - 3 100 a. C.) DISPOSIÇÃO VERTICAL
 
DISPOSIÇÃO HORIZONTAL

 

ALGARISMOS CUNEIFORMES (conhecidos ao menos desde o século XVII a. C.)

Evolução gráfica dos algarismos de origem suméria.

 

O princípio da numeração escrita suméria

    Com estes sistemas de representação de algarismos os sumérios conseguiam obter qualquer número, baseando-se no princípio aditivo e, repetindo as vezes necessárias em cada ordem de unidades um algarismo,  obtinha-se o número pretendido. É de notar a preocupação que existia em agrupar os algarismos idênticos com o objectivo de facilitar a sua rápida visualização e compreensão.

36 000 reproduzido 3 vezes = 36 000 × 3 = 108 000
3 600 reproduzido 4 vezes = 3 600 × 4 = 14 400
600 reproduzido 3 vezes = 600 × 3 = 1 800
60 reproduzido 1 vez = 60 × 1 = 60
10 reproduzido 3 vezes = 10 × 3 = 30

1 reproduzido 6 vezes

= 1 ×6 = 6

 

 

 

 

 

124296

 Representação do número 164571, com recurso aos algarismos arcaicos.

 

  30 8 60 50 7 180 40 1 240 40 1 120 10 9
4 38 117 221 281 139

Representação do número 800, com recurso aos algarismos cuneiformes.

 

    De forma a simplificar e evitar as desmedidas repetições de sinais idênticos, os escribas de Sumer usaram frequentemente o método subtractivo, escrevendo, por exemplo, os números 9, 18, 38, 57, 2360, 3110, da seguinte forma:

 

10 - 1 20 - 2 40 - 2 60 - 3
9 18 38 57
2 400 - 40 3 120 - 10
2360 3 110

O sinal ou era precisamente o equivalente ao nosso "menos"

Representação de números recorrendo ao método subtractivo.

 

    Também no sentido da simplificação da escrita, os múltiplos de 36000 passaram a ser representados da seguinte forma (em vez de se usar a repetição continua dos símbolos):

 

72 000

108 000

144 000

180 000

216 000

 Representação simplificada de alguns múltiplos de 36000.

 

Como calculavam os sumérios 

 

    Bilhas, cones e esferas para calcular

        Para fazer cálculos os sumérios utilizavam objectos que, consoante a sua forma e tamanho, representavam as diferentes ordens de unidade do sistema sexagesimal:

1

  pequeno cone

10

  bilha

60

  grande cone

600

  grande cone perfurado

3600

  esfera

36000

  esfera perfurada

Objectos utilizados no cálculo.

       

            O processo operatório no qual se baseavam para realizar a divisão consistia, no final de cada etapa, em trocar os objectos pelos de ordem imediatamente inferior. Com efeito, consideremos o seguinte exemplo:

    Dividir 324000 por 7

    324000=9×36000

    Como se pretende a divisão por 7, repartiremos 9 esferas perfuradas por grupos de 7 (note-se que as esferas representam a maior unidade neste sistema):

 

1 grupo

Primeiro resto

         

 

   

    O número de grupos de 7 esferas perfuradas que resulta desta primeira divisão é igual a 1, ou seja, o quociente desta primeira divisão parcial é 1. No final desta primeira divisão restam 2 esferas perfuradas.

    Para se poder prosseguir a operação é necessário converter 2×36000 em múltiplos de 3600 (unidade imediatamente inferior a 36000). Deste modo 2×36000=2×10×3600=20×3600. Obtemos assim 20 esferas simples, que repartimos novamente por grupos de 7:

 

2 grupos

 

Segundo resto

 

 

  

    O número de grupos de 7 esferas simples que resulta da segunda divisão é igual a 2, ou seja, o quociente desta segunda divisão parcial é 2 e restam 6 esferas simples.

    Para prosseguir  a operação vamos converter 6×3600 em múltiplos de 600. Obtemos assim 36 grandes cones perfurados, que repartimos novamente por grupos de 7:

 

 

5 grupos

 

 

 

 

Terceiro resto

           

 

   

    O número de grupos de 7 grandes cones perfurados que resulta da terceira divisão é igual a 5 (quociente) e sobra 1 grande cone perfurado (resto).

    De seguida converteremos 1×600 em múltiplos de 60. Obtemos assim 10 grandes cones simples, que repartimos novamente por grupos de 7:

 

1 grupo

Quarto resto

       

 

   

    O número de grupos de 7 grandes cones simples que resulta da quarta divisão é igual a 1 (quociente) e sobram 3 grandes cones simples (resto).

    Depois de converter 3×60 em múltiplos de 10 obtemos 18 bilhas, que repartimos novamente por grupos de 7:

 

 

2 grupos

 

 

Quinto resto

     

 

    

    O número de grupos de 7 bilhas que resulta da quinta divisão é igual a 2 (quociente) restando 4 bilhas.

    Para terminar a operação resta-nos converter 4×10=40 por grupos de 7:

 

 

5 grupos

 

 

 

 

 

Sexto resto

   

 

    O número de grupos de 7 pequenos cones que resulta da quinta divisão é igual a 50 (quociente) e restam 5 pequenos cones.

    O quociente final obtém-se fazendo a adição dos quocientes obtidos nas várias divisões, com efeito:

        1×36000+2×3600+5×600+1×60+2×10+5×1=46285 (quociente da divisão de 324000 por 7)

 

    Das pedras ao ábaco

 

    Posteriormente foi adoptado um outro processo que consistia em organizar por colunas as contagens que se efectuavam, sendo a primeira (a da direita) associada às unidades, a seguinte às dezenas e assim sucessivamente.

Consideremos o seguinte o exemplo: Representação do número 3672

M

C

D

U

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

    Mais tarde este método de cálculo deu origem ao ábaco de pedras.

 

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