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Pascal convertido à religião dedica-se à filosofia... Pascal dedicou-se ainda ao estudo da teologia, das concepções místico-morais, era um excelente escritor. Com uma crise mística, Pascal convence-se e retira-se definitivamente do mundo, e resolve viver em meditação, no Convento de Port Royal, onde já havia entrado, como freira, sua irmã Jacqueline. (Cela de Pascal no convento de Port Royal)
Depois de participar em grupos dados à "libertinagem" e aos jogos de azar, Pascal experimentou uma revolução na sua vida. Em 1654, escapou da morte num acidente de carruagem numa das pontes de Paris. Logo depois, num êxtase espiritual, decidiu dedicar-se com fervor à militância religiosa e depois à contemplação e à oração. após a conversão, documentada de forma comovente em Memorial:
Certeza, certeza, sentimento, alegria, paz. Deus de Jesus Cristo. Deum meum et Deum vestrum (meu Deus e vosso Deus). Esquecimento do mundo e de tudo, menos de Deus. Não se encontra fora das vias ensinadas no Envangelho. Grandeza da alma humana. Pai justo, o mundo não te conheceu, mas eu te conheci. Alegria, alegria, alegria, lágriams de alegria. Eu me separei dEle, Derliquerunt Me fontem aquae vivae (Abandonaram a Mim, fonte de água viv). "Abandonar-me-ias vós, meu Deus?" Que eu não me separe dele pela eternidade. A vida eterna é esta: que eles te conheçam a ti, o Deuis único e verdadeiro e aquele que enviaste, Jesus Cristo, Eu me afastei dele, evitei-O, reneguei-O, crucifiquei-O, que eu jamais me separe dEle. Não se converta senão pelas vias ensinadas no evangelho. Renúncia total e doce. Submissão completa e Jesus Cristo e ao meu director, Alegria eterna por um dia de provação na terra. Non obliviar sermones tuos. Amen (Não me esquecerei das tuas palavras. Amém)
Pascal faz grandes progressos na vida espiritual como se pode verificar em Oração para pedir a Deus a graça de fazer bom uso das enfermidades, escrito edificante e perene. "À conversão segue-se o reatamento de relações, cada vez mais frequentes e intensas com Port Royal, que por esta época, tinha recebido dentro dos seus muros um pequeno grupo de leigos" (Mondin, 1981). Pascal converteu-se naquela época, ao jansenismo, uma corrente religiosa nascida no catolicismo. O movimento teve início com com um bispo holandês que protestava contra o racionalismo supostamente exagerado da teologia escolástica. É em Port Royal, que Pascal escreve as Cartas Provinciais, que fez circular anónimas, nas quais a dialéctica habilíssima e com uma ironia ora subtil, ora dura, abordava os aspectos discutíveis da Companhia de Jesus. Mais tarde veio-lhe a ideia de escrever uma Apologia da Religião Cristã, projecto que não pôde realizar em virtude da sua morte prematura. Os fragmentos desta obra foram reunidos no volume intitulado Pensées (Pensamentos).
Num certo sentido, podemos afirmar que, convertido à religião, Pascal dedica-se à filosofia. Blaise Pascal foi uma excepção na sua época. Enquanto a maioria dos filósofos viviam quase exclusivamente da herança de Descartes, que defendia o racionalismo e a especulação lógica, fria, clara e precisa aplicada a toda e qualquer forma de ciência, seja ela exacta ou humana, Pascal moveu uma guerra contra esses conceitos.
A existência humana nesta terra, para Pascal, é paradoxal, uma vez que muda de condição e de qualidade se é colocada em dois extremos opostos. Existe um dualismo presente em todas as coisas. Nos pensamentos de Pascal a condição humana é colocada em relação: ele tanto pode ser como não ser. O tema de dois extremos opostos aparece em vários passagens dos Pensamentos. Analisando a desproporção do Homem Pascal diz:
Para Pascal, o Homem é um ponto intermediário entre o tudo e o nada -, ponto este não linear, mas pertencente à estrutura interna, psicológica do Homem. Para Pascal, é impossível ao Homem conhecer a verdade, pois esta exige o conhecimento dos dois extremos. Para Pascal, somente em Deus os dois extremos se unem, convergem, como num círculo. Porém para conhecer Deus, o Homem deve primeiro saber-se nada. Sabendo-se nada, torna-se tudo. è este o segredo que o fino moralismo de Pascal guarda, o de que, ao livrar-se da sua máscara que a arrogância, o amor e o ódio ao eu produzem, o Homem consegue achar a solução para a tensão entre os dois contrários. Mas Deus não é conhecido pela razão. O espírito geométrico não ocupa a totalidade do espírito, o sentimento, com efeito, é mais presente do que o raciocínio. O coração, diz Pascal, tem razões que a própria razão desconhece, e é ele quem permite perceber a conciliação enter os dois infinitos. Pascal aponta a debilidade da razão: mesmo na geometria, o axioma é uma verdade intuitiva e indemonstrável, ou seja, tão clara que é o coração que a conhece.
Dos Pensamentos, são também retiradas várias críticas a Descartes. Vejamos algumas delas:
Neste pensamento, propõe-se escrever futuramente contra Descartes, por causa da importância excessiva dada por este à ciência.
Neste pensamento, declara não poder perdoar a Descartes por ter dado pouco espaço a Deus na sua filosofia.
Neste pensamento, pascal sustenta que não vale a pena perder tempo com a filosofia de Descartes. Em muitos outros pensamentos Pascal critica Descartes, sem citá-lo. A crítica é dirigida especialmente contra o método geométrico cartesiano e contra a mentalidade geométrica do seu autor, que pretende reduzir tudo a ideias claras e distintas. Segundo Pascal, o método geométrico é válido para as ciências exactas, não para as humanas - filosofia, moral, religião - nas quais, em vez de ideias claras e distintas, prevalecem ideias complexas, mas carregadas de verdades. Pascal não condena totalmente o método geométrico; rejeita apenas a pretensão de aplicá-lo a qualquer verdade, em especial às da esfera religiosa.
Em conclusão, o erro de Descartes consiste em ter exagerado o factor intelectivo (negligenciando completamente o factor afectivo) e a importância da razão e da especulação (subestimando a contribuição do coração). Pascal julga pretensioso o projecto que Descartes concebeu num insight, numa noite de Inverno, de dar alicerces da construção de uma ciência universal. Pascal não pode perdoar Descartes, que através da sua dúvida metódica, reduziu o mundo a uma dimensão quase solipsista, até chegar à primeira verdade: o eu é uma coisa que pensa. Pascal condena tanto o uso de Deus em Descartes - que serviria "apenas" para objectivar o mundo -, quanto o eu apenas racional, puro pensamento.
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