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A
vida e as obras
Górgias nasceu na Sicília, em
Leontinos, entre 485 e 480 a.C.. Em 427 a.C., quando Leontinos foi ameaçada por
Siracusa, foi encarregado de conduzir a
Atenas uma missão a pedir socorro.
Górgias, defende a causa da sua pátria perante a Assembleia do Povo, em
Atenas, onde alcança um grande sucesso pela sua eloquência.
O seu estilo é tão pessoal que os gregos criarão o termo "gorgianizar" para designar "falar à maneira de
Górgias". Com o seu estilo, Górgias conquista para o seu ensino vários atenienses de alta estirpe e percorre toda a Grécia sem se fixar. Na Tessália ensinou
Isócrates, que veio a fundar em Atenas uma escola rival da
Academia. Parece ter ficado celibatário e ter passado o fim da sua vida na Tessália, onde morre mais que centenário. |
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A sua audiência e celebridade era tão grande na Grécia que lhe ergueram uma estátua de ouro maciço em
Olímpia. Foi, sem dúvida, devido à sua imensa fama que os fragmentos existentes de Górgias são os mais numerosos e completos de todos os sofistas. Existem até certas obras
em extenso, como é o caso d' "O Elogio de Helena" e d'
"A Defesa de Palamedes".
As obras de Górgias podem distribuir-se em três grandes grupos. O primeiro compreende os textos de tom essencialmente filosófico, como é o caso de
"Sobre o Não-Ser ou Sobre a Natureza",
"O Elogio de Helena" e
"A Defesa de Palamedes". Os textos do segundo grupo testemunham sobretudo a preocupação pela eloquência e dele constam:
"A Oração Fúnebre", "O Discurso Olímpico",
"O Elogio dos Elisinos" e "O Elogio de Aquiles". O terceiro grupo de escritos está relacionado com a técnica retórica e
compreende "A Arte Oratória" e "O Onosmástico".
A
autodestruição da ontologia
O Tratado do Não-Ser organiza-se em três teses: nada existe; mesmo se o ser existisse, então seria
incognoscível; e se fosse cognoscível, então este conhecimento do ser seria incomunicável a
outrem.
Para Górgias as coisas não são mais do que não são. Ainda que o ser existisse, não podia ser nem gerado, nem não gerado.
Mas, mesmo se um tal ser existisse, as coisas seriam incognoscíveis, pelo menos para nós. As coisas que vemos e ouvimos existem porque são representadas. Ora, pode representar-se o que não existe. Portanto, a representação do ser não nos proporciona o ser e o conhecimento é impossível.
Contudo, tomamos conhecimento pela percepção e comunicamo-lo pela linguagem. Mas a linguagem não transmite a experiência pela qual o real se nos dá. Este é incomunicável, porque as coisas não são discursos.
A
poesia da ilusão
Das ruínas da ontologia, Górgias deduziu um pensamento não ontológico ou
antimetafísico, onde reabilitava as aparências e afirmava a identidade entre o real e a manifestação.
Se a aparência é modificável, o ser também o será. Isto nada tem de escandaloso já que, a realidade é contraditória e o princípio de identidade origina apenas uma ontologia que se contradiz a si própria. De facto, Górgias tinha uma concepção trágica da realidade. Ele tinha o sentimento profundo de que a linguagem não evoca senão a aparência, mas que esta aparência é legítima, do que é exemplo
"O Elogio de Helena".
Para Górgias, o real está dilacerado pelas contradições, o mundo humano exige uma tomada de posição e este mundo humano está por fazer. Seria através da poesia, nomeadamente da arte, que esta tomada de posição seria efectuada. Portanto, o papel da poesia seria criar a ilusão, mas uma ilusão desejável e boa. Só esta criaria a coerência mental a que Górgias chama justiça e sabedoria.
A arte do sofista, isto é, do homem sábio, era, segundo
Górgias, uma "ilusão justificada". O discurso sofístico, ainda que expresso em prosa, faria parte da poesia e a ilusão justificada seria tanto mais justificada quanto mais partilhada fosse pelos ouvintes.
A ilusão justificada é, principalmente, fruto da linguagem poética, que age no ouvinte de modo a sugestioná-lo. O problema central dos poderes da linguagem vai desembocar no estudo da receptividade da alma para a
musicalidade das palavras. A este estudo os antigos chamaram-lhe
"psicagogia", arte de levar a alma, pela persuasão, até onde se quiser levar.
A psicagogia
Para Górgias, a alma é essencialmente passiva, completamente entregue ao que recebe de fora. A primeira forma desta passividade é a percepção sensível, que é vista como o transporte para a alma de uma impressão ou de uma imagem das coisas que a alma experimenta.
A segunda forma de passividade da alma é a sua abertura à linguagem. Contudo, para que a alma seja sempre
receptiva à linguagem é, por vezes, necessário recorrer à persuasão.
O discurso isolado nada pode sem o esforço da persuasão, que age não só sobre os sentidos mas também sobre a alma. Persuadir consiste em criar uma recepção psíquica dos ouvintes aos argumentos, dando-lhes peso.
Segundo Górgias, a natureza profunda desta persuasão é poética, é a palavra ritmada. Atento a isto, Górgias inventou figuras de estilo que marcam o ritmo. Lembre-se que Górgias é originário da Grande Grécia e sofreu, precisamente, influência
pitagórica, seita esta que estudou os efeitos da música. O próprio vocabulário usado para significar a acção da palavra persuasiva remete-nos para as práticas da magia.
A persuasão do discurso age por feitiço. O sofista é o feiticeiro. Também o discurso de Górgias age como magia, uma vez que este se serve nele da linguagem.
O tempo como momento oportuno
O pensamento de que o tempo não é um meio homogéneo e indiferente, mas que apresenta ocasiões favoráveis para a acção que vem a propósito, é um sentimento que já estava presente no helenismo antes de
Górgias. Contudo, é este o primeiro a escrever sobre o kairós. Górgias concebia um tempo essencialmente descontínuo, feito de a-propósitos e de contratempos, que não se deixam perspectivar.
A realidade é contraditória e a poesia da ilusão poupa o homem ao sofrimento, privilegiando um dos contrários por uma tomada de posição unilateral. A escolha por um dos contrários não é arbitrária e gratuita, exige sabedoria e sentido de justiça.
Foi o primeiro pensador de uma temporalidade prática e estava preparado para formar os homens políticos, os futuros governantes, uma vez que a política é uma ciência sem princípios definidos. O
kairós tem, sem dúvida, valor político na medida em que é retórico e a retórica é na democracia ateniense um instrumento de poder. O
kairós também intervém na formação dos chefes militares, mas é na vida ética que o seu conhecimento é essencial.
O ideal da arte do kairós é tornar a vida moral praticável. Mas o
kairós não significa apenas o momento favorável na vida prática e a arte de o colher, ele decide da natureza do tempo e concebe-o. O que exclui a valorização da duração, do longo prazo, da eternidade, conceitos combatidos por
Górgias. A coerência das concepções de Górgias não permitem pensar que este se tivesse simplesmente entregue às diversões retóricas sem outra consequência que a de demonstrar o seu talento oratório. Lógico implacável, excelente artista e pensador profundo,
Górgias, como testemunha a abundância dos seus fragmentos, exerceu nos seus sucessores uma profunda
influência.
Para saber mais sobre Górgias:
http://www.utm.edu/research/iep/g/gorgias.htm 
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